Os Borlububos e a dança das letras
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Os Borlububos e a Dança das Letras – Histórinhas D’ Embalar #30
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Os Borlububos são fantasminhas que vivem nos subterrâneos do Porto, antigos aquedutos que transportavam a água até à cidade, quando o Porto era mais pequeno e ainda não tinha água canalizada.
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Os dois fantasminhas são irmãos e gostam muito um do outro. O Borlububo, que é o mais novo, tem uma grande admiração pela irmã, Borlububa, e quer ser como ela quando for grande. Considera-a sábia porque ela responde a todas as suas perguntas. E ele é bastante perguntador.
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Mas a mana não se irrita e até parece gostar que ele seja tão curioso. É sinal de inteligência. Por isso, quando ela sai dos subterrâneos, o irmão acompanha-a.
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Saem sempre à noite porque os seus olhos, habituados à escuridão dos aquedutos, não toleram a luz solar.
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Esta noite, a Bolububa quer mostrar ao irmão a parte Oriental da cidade. Por isso, em vez de saírem pelo sítio do costume, frente à igreja dos Congregados, seguem por outro ramal. Andam um bocado em subida, a té a Borlububa levanta uma tampa de saneamento e espreita para ver onde estão. O seu olhar é imediatamente atraído por uma enorme janela, iluminada, na Avenida de Rodrigues de Freitas.
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– Saímos já daqui – diz ela, ajudando o irmão a subir.
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Coloca a tampa no lugar e aproxima-se da grande janela, que mais parece uma parede envidraçada. Do outro lado do vidro, vêem uma menina numa cadeira de rodas, segurando nas mãos um livro aberto, enquanto a mãe lhe entrança os cabelos.
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Parece uma fada pequenina.
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Encantada com aquela visão, a Borlububa cola-se à vidraça e o irmão imita-a. Parecem hipnotizados.
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Ninguém os vê porque são fantasmas e todos os fantasmas, mesmo os pequeninos são invisíveis.
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Com o dedo a deslizar sobre o livro, da esquerda para a direita, a menina trauteia:
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– Tro-fá-fá´rá! O comboio da Trofa pára! Tro-fá-fá-rá!
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O comboio da Trofa arranca.
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– O que é aquilo?! Pergunta o Borlububo.
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– é um trava línguas – responde-lhe a irmã.
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– E para que serve?
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– É a ginástica da fala – diz-lhe a Borlububa, reparando que a menina pousa o livro com ar de desânimo.
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Oh! As letras estão todas agarradas ao livro. Ajudas-me a arranca-las, mãe?
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– Não Teresinha! Não pode ser. As letras pertencem ao livro.
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– Mas eu preciso das letras para formar novas palavras.
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– Brinca com elas assim, filha. O papá está a chegar para te ler uma historia e dar-te as boas noites – aconselha a mãe, colocando-a na cama.
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É então que o Borlububo repara na magreza das desvitalizadas pernas da menina.
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-Que é que ela tem nas pernas?
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– é paraplégica – responde a irmã.
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O Borlububo vai fazer outra pergunta quando a irmã o chama com uma palmadinha no ombro.
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– Vem daí!
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Seguindo a irmã, uns passinhos atras dela, o Borbulho pergunta:
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– Já vamos embora?
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– Não ouviste a menina a dizer que queria brincar com letras soltas? Vamos ajuda-la a satisfazer o seu desejo.
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– E onde vamos buscar letras?
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– À casa dos livros!
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– Hum…?! Os livros têm casa?
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– Claro!
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– E os sem-abrigo não…? – Questiona. Como falasse sozinho.
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A Borlububa detém-se e volta-se, cobrindo o irmão com um olhar embevecido. Aquela associação de ideias pareceu-lhe ter mais sacarmos que inocência.
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– Não é a mesma coisa – esclarece. Os livros são coisas e os sem-abrigo são pessoas. E as pessoas é que fazem as casas e os livros…
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– São? E os sem-abrigo, quem os faz?
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– Não caiem do céu, é verdade, mas depois explico. Agora temos que nos despachar com as letras, antes que a menina adormeça.
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Embora ainda confuso, o fantasminha muda de assunto:
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– E a casa dos livros onde é? Na livraria…?
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A Borlububa agita a cabeça em sinal negativo.
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– As livrarias são lojas. Os Livros não moram lá. Só lá estão de passagem, até que as pessoas se interessem por eles e os comprem. Para os lerem elas mesmas ou para oferecerem a outros leitores.
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– Mas, então onde moram?
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– Chegámos! – informa a Borlububa.
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Esta é a casa dos livros: a Biblioteca. É aqui que os livros moram. Segue-me! Temos de ser rápidos, senão a menina adormece triste.
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Um atrás do outro, os dois fantasminhas entram na Biblioteca e vão direitos à sala dos livros para a infância.
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(CONTINUA)
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Para a semana não deixe de ler o que se veio a passar na casa dos livros!