Entre Patentes e Invenções: A História do Limpa Para-brisas
Sabia que a invenção do limpa para-brisas aconteceu nos Estados Unidos da América, mas a sua autoria continua a ser tema de discussões acesas?
De forma instintiva, mecânica e quase automática, assim que caem as primeiras gotas de chuva, acionamos o limpa para-brisas dos nossos automóveis. Quase nem pensamos nele como um aliado importante na segurança rodoviária, apesar de o ser!
A primeira patente relacionada com o limpa para-brisas foi registada em 1896, por George J. Capewell.
A segunda patente relativa a este dispositivo é de Robert Douglas, desenvolvida para remover neve e detritos que se acumulassem nos vidros das locomotivas. Era muito mais avançada do que o processo desenvolvido pelo seu antecessor.
Costuma dizer-se que à terceira é de vez, e é com o registo da terceira patente, obtida por Mary Anderson a 10 de novembro de 1903, com o número 743.801, que se costuma atribuir a verdadeira origem do limpa para-brisas – o primeiro sistema de segurança ativa desenvolvido para o automóvel e que hoje damos por garantido.
Sabemos que é sempre a “necessidade que aguça o engenho”, e esta não foi exceção! Durante uma viagem a Nova Iorque, Mary Anderson observou os motoristas dos transportes a fazer paragens frequentes para se “desembaraçarem” da neve que se acumulava nos vidros, impedindo a visibilidade necessária para uma condução segura. Em alguns momentos, chegou a ver motoristas a conduzir com a cabeça fora da janela para evitar tantas paragens e assim poderem continuar a marcha. Apesar de ser uma mulher a tentar “navegar” num mundo predominantemente masculino, dedicou-se de imediato ao problema e desenvolveu um sistema tão engenhoso que serviu de base para toda a evolução subsequente deste importante sistema de segurança.
O mecanismo era composto por uma manivela, localizada no interior do veículo, que o condutor podia acionar. Esta manivela estava ligada a uma escova no exterior do veículo, removendo o que se acumulava no para-brisas.
Consta que Mary, além de inventora, era uma verdadeira empreendedora e chegou a produzir este engenho em pequena escala, tentando vendê-lo a uma empresa canadiana, mas sem sucesso.
Entretanto, surge Henry Ford, que em junho de 1903 inicia a produção do seu modelo A, que começa a ser comercializado em Detroit a partir de julho desse ano. Existe muita especulação sobre se Ford tinha conhecimento da patente de Mary, mas o certo é que ele reinterpretou o dispositivo e testou-o nos seus automóveis.
A partir de 1908, o modelo T já saía de fábrica com este aparelho instalado. Como acontece muitas vezes com a inovação, esta foi alvo de críticas. Talvez por essa razão, a patente de Mary expirou antes que ela pudesse obter algum rendimento, com algumas vozes a considerarem o dispositivo potencialmente distrator para a condução.
Há, entretanto, outros nomes associados a patentes que denotam a evolução deste engenho. Em 1916, John W. Jepson; em 1917, outra mulher, Charlotte Bridgewood (ainda vos falarei sobre a sua filha!); em 1919, William e Fred Foberth, com o limpa para-brisas automático, que funcionava a vácuo; e, em 1923, Raymond Anderson, que registou a patente do limpa para-brisas automático, com a particularidade da intermitência e já alimentado de forma elétrica.
No entanto, é o nome de Robert W. Kearns que acaba por se destacar, e apenas em 1964, neste setor. Note-se que só nos anos 50 é que a utilização do automóvel se intensificou, apresentando novos desafios que impulsionaram o desenvolvimento de soluções mais eficientes.
Robert Kearns é responsável pelo desenvolvimento de um limpa para-brisas que atua de forma intermitente, mas que é capaz de se “auto-regular”, determinando automaticamente o intervalo entre cada movimento — uma função que o seu antecessor não possuía.
De facto, o sistema intermitente anteriormente disponível era regulado pelo condutor e não de forma automática pelo dispositivo. Mais uma vez, o nome de Ford, mais especificamente a Ford Motor Company, surge na equação, pois Kearns apresentou o seu invento, que a companhia não quis adquirir.
Curiosamente, em 1969, um dispositivo idêntico apareceu nos seus automóveis. Kearns avançou com um processo judicial contra o gigante Ford, entre outras marcas que também estavam a utilizar o dispositivo, como a Chrysler — viria a arrecadar cerca de 40.000 USD entre estas duas marcas, apenas em 1990.
Esta ação teve uma notoriedade tão elevada que deu origem a um filme, imperdível para quem queira aprofundar o conhecimento neste capítulo da história da Ford, de Kearns e do próprio engenho do limpa para-brisas — que continua a evitar sinistros de forma ativa!